domingo, 20 de dezembro de 2015



É uma relação que cresce aos poucos, num tempo lento de namoro mas que fez aquela diferença à primeira vista. Descreveria assim, entre outras coisas, a minha relação com a Lousã. Nos primórdios da minha adolescência passava horas a imaginar que vivia numa casa de pedra dessas aldeias desertas por entre as serras. Vinte anos depois (per)corri-a pela primeira vez e senti-me em perfeita sintonia com a envolvente e encantada pelas casas de xisto. Um ano depois (per)corri uma segunda vez e prometi regressar no próximo ano. Sem saber da minha promessa, num vamos-ali-e-já-voltamos o G. levou-me lá a terceira e quarta vez este mês. Depois do Casal de S. Simão, vi a Serra da Lousã na aproximação ao primeiro destino. As ruínas de uma central elétrica por onde nos aventuramos em registos e enquadramentos. Eu, novata nestas incursões pelo meu próprio pé, deixo que o meu fascínio pela história dos abandonados me guie na atenção aos pormenores que outrora eram o pão nosso de outras vidas. O meu olhar romântico varia na mesma razão desse tempo que passou e repetidamente na mesma razão desta nossa partilha de tempo e espaço. Os nossos passos nesta exploração são a valsa que dançamos no salão do nosso imaginário, ou pelo menos é assim que eu vejo o nosso tranquilo rodopio pela maquinaria desmantelada, pelas escadas que nos levam ao patamar de cima, pelas alavancas que hoje accionam apenas a nossa curiosidade e pelos grandes carretos que me transportam aos “Tempos Modernos” de Chaplin. Dou à manivela gigante nesse espanto que a ferrugem, tão presente por todo o lado, ainda não a parou no tempo. A valsa teve como acompanhamento a água que passa no rio ali ao lado e por baixo da própria central. Hoje, a força da sua passagem gera somente em nós aquela energia tranquila que nos trás o seu escutar.


foto do G.


Das margens do rio Ceira no Casal Ermio avançamos com a noite para junto do Castelo Arouce apreciando de longe o recorte iluminado das Ermidas da Sra. da Piedade e de perto as escadas que nos permitem subi-las. A noite esconde de mim, com uma mão, a beleza do verde envolvente e a magnitude do espaço e dá, com a outra mão, essa mística que encerra no escuro os caminhos que nos podiam levar às aldeias mais próximas, por entre a flora e a fauna “adormecida” e ainda mais abafada pela ribeira de S. João. Estando escuro mas não sendo tarde, subimos até ao Talasnal. Fomos de carro para que a mística da noite e a descida da temperatura sejam a combinação perfeita da travessia da serra com as vistas para o ponteado de iluminação, desde a civilizada Lousã até à aldeia que ansiamos reencontrar. Caminhamos nas ruas, estreitas e amarelecidas pela luz dos candeeiros, encurtadas pela noite que circunscreve a periferia e detemos-nos na frente da Ti Lena o tempo suficiente para perceber que ainda chegamos a tempo de um petisco e da simpatia de quem nos recebe.

Com a despedida vem a decisão de continuar a subir. Passamos perto do ponto mais alto, não sem antes nos depararmos com um veado que deve ter ficado tão surpreendido como nós com aquele encontro.

foto do G.


São estas, entre outras historias que vou guardando deste namoro, com esta serra, que me surpreende pelos mimos que me dá, nesta crescente admiração por aquilo que é natural em si e por aquilo que é fruto do empenho... das suas gentes em estimar este património... partilhando-o comigo.


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