Não questionar o destino, diz desta forma de
seguir confiante na viagem e na companhia, acreditando à partida que são as
melhores que posso agradecer. O caminho já era paisagem para apreciar e o sol o
anfitrião desta fuga. O sol de inverno é inspirador pela forma como nos mima e
afaga a pele com o seu calor. Faz-me entrar inconsciente naquele ciclo de
sentir vontade de fechar os olhos para o apreciar em mim e abri-los para ver
como ilumina o meu redor.
Lá fomos por partes, seguindo-se a minha
sequência favorita. Aquela em que trocamos as rodas pelos nossos passos, para
depois trocarmos o alcatrão pela terra batida e finalmente trocarmos esta
ultima, pelo trilho. Acrescento que esta sequência foi quase sempre a subir,
não para dar ideia da dificuldade, mas para não esquecer as vezes em que me
virei para trás e vi a paisagem a crescer para terra e para o mar. Mergulhei
com a vegetação à altura da cintura, com uma visão privilegiada da envolvente. Olha aqui, olha ali… e este cheirinho que
nunca posso levar para casa… grava grava… não esquece. Pensamentos
suficientemente curtos para não me dispersar do essencial e dar espaço a outros
que se prendem com o meu olhar para dentro. Continuava sem fazer a menor ideia do que
me esperava e o quer que fosse não podia esperar muito, pois apesar do sol
fazer lembrar o verão, a hora é de inverno. Andei de baloiço, ri e caí. Apressamo-nos
a descer, tirando aqui e ali os olhos do trilho empedrado para olhar lá mais
para baixo e eternizar a paisagem em pixéis. Continuei Olha aqui, olha ali… e este cheirinho que nunca posso levar para casa… grava
grava… não esquece. Não esquece este mar azul turquesa….Mar?!... Azul
turquesa?! Mas como é que eu vim aqui parar?! É isto que me espera?!
A temperatura amena permitia-nos conspirar sobre
a eventualidade de ir a banhos mas cruzarmo-nos com quem já estava de subida
fazia-nos duvidar de tamanha loucura em pleno Novembro. Finalmente chegar lá a baixo
e fazer uma última troca. Trocar o trilho pelo areal.
Diz que a falésia tem a forma de um pescoço de cavalo
mas eu diria que podia assemelhar-se a uma orelha, onde se encerram segredos vários.
O céu límpido deixou-me vislumbrar na forma de uma rocha um barco ancorado à
costa e mais à frente descobri noutra o perfil de um rosto. Se este rosto sussurrasse frases
bonitas à praia, certamente lhe diria que é linda. Assim como foi lindo o gesto
de me levar ali àquele cantinho do mundo. Pude observar o rebentamento das
pequenas ondas que avançavam para terra e com o meu lenço esvoaçante senti-me
como o principezinho a ver divertido os vários pores-do-sol do seu planeta. Da
rosa que trago sempre comigo, os espinhos não são se não aquilo que me desperta
para a importância de aproveitar a vida.
E de repente os segredos a ser confessados podiam
ser só os nossos, pois não tardamos a ficar sós por entre os tons pastel de um
fim de tarde. Estava na hora de regressar e foi já nos escuro que nos guiamos
pela claridade do trilho e pelo instinto da minha desorientação para chegar
novamente ao topo. Invertida a sequência rolamos depois até à marginal de
Sesimbra onde passeamos mais um pouco e onde quase fui engolida por baleia. Não
me salvou nenhum príncipe desta Moby Dick urbana mas regressei a casa com a sensação
que me resgatou antes para um destino onde sabia que tudo o que eu precisava era
de ser feliz.
