sábado, 31 de dezembro de 2011

Imediatamente a seguir à ausência da minha mãe e de toda uma rotina, que girava à sua volta, um não cessar da nossa atenção sobre ela e tudo o que a ela dizia respeito, impôs-se o vazio e o silêncio. Para amenizar o tempo “desocupado” fui buscar a sua caixa das agulhas de tricot e muito aquém do que ela sabia fazer resolvi ocupar-me com algo que me era mais familiar na perspectiva de observadora/utilizadora. Tenho presente na memoria todas as camisolas e casacos de cores e feitios engenhosos que a minha mãe me fez, para estrear nos dias especiais. Depois ficavam para vestir aos domingos, de vez em quando, levava para escola e quando estavam a deixar de servir vestia quando queria.
Tinha quatro novelos, três cores e uma “receita” tirada da net. Iniciei, tricotando em malha do avesso, uma terapia saltitando entre as três cores.
Da esquerda para a direita, vislumbram-se três fases diferentes: primeiro, manter a disciplina da rotina, segundo, adormecer na cadência dos gestos, terceiro a libertação do padronizado.
A conclusão do poncho coincidiu com o aniversário da amiga que esteve lá, antes de tudo, durante tudo, e depois de tudo, com palavras, amparo e paciência. Foi a ela que ofereci este relevo da alma.

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

O Natal chegou e já lá vai.









Ocupei-me de maneira que não tive de esperar por ele. Assim nos meandros das lembranças dos Natais passados e realizados pela minha mãe realizei ideias para não ter de esperar. Foi assim que dei inicio a um projecto pessoal na área da pintura. Há muito que as ideias vinham e iam, tomava notas, fazia esboços… e “gaveta”. Gaveta entre aspas porque ainda não há uma gaveta de verdade. Surgiram novas ideias (como aquele número do mágico que tira da cartola lenços presos por nós de diversas cores), depois maturaram até ao ponto em que começaram a passar do esboço para o material final dando origem a um produto que não me deixa mais realizada porque não o posso partilhar com a minha mãe. Olho para os desenhos, que englobam um conjunto de opções, e identifico-me com essa globalidade e não apenas com alguns pormenores. Deste projecto falarei mais tarde.
Inspirada neste blog (eraumavezaqui)surgiu a ideia de preparar, para oferecer no Natal, um miminho a quem este ano de 2011 esteve lá. No momento difícil ou de quem sem estar muito presente conseguiu usar das palavras certas para me restituir alguma esperança. Um miminho onde para alem dos 16 ingredientes + imaginação+carinho dispus da semente que a minha mãe me deixou para a doçaria. Mãos para que vos quero.
Enquanto fiz os bolinhos revisitei os utensílios de cozinha que só usei a quatro braços, memórias dos momentos em que me deixou ir ajudando a fazer bolinhos de coco (bolinhas de açúcar, ovo e coco servidos em forminhas de papel plissadas) até quando já só inspeccionava/controlava se eu não usava da imaginação na confecção das receitas e me extraviava do descrito nos vários livrinhos escritos à mão. Um dia destes enquanto os folheava para descobrir onde estavam as receitas dos bolos que costumávamos fazer, pois normalmente quando eu entrava em cena as pesagens dos ingredientes já estavam feitas (para evitar a tal imaginação ou a minha vontade de reduzir no açúcar), descobri que essas receitas se podem encontrar procurando por páginas com nódoas em vez de ler os títulos.
Para os bolinhos de Natal usei a imaginação e o nome surgiu depois de saírem do forno todos coladinhos…Remendados de chocolate

Um sortido de:
- dois remendados de chocolate com sabor a limão, dois remendados de chocolate com sabor a canela e pedacinhos de noz com um remendado de gengibre em cima(mais artístico) e dois remendados de chocolate com sabor a erva-doce (com espírito, diz o meu pai). No fundo um pedacinho de céu para pendurar na árvore de Natal, tudo dentro de uma caixinha de pasteleiro com imagem personalizada atada com um fio de .

Foi assim:

sábado, 5 de novembro de 2011


Um meteorito embateu na minha lua deixando uma cratera em forma de saudade….do relevo …ficou uma espécie de braille da dor.
Nunca parece ser o momento certo para escrever, apesar de continuar a não parecer, hoje, apetece-me escrever além de pensar. Os dias sucedem-se numa catadupa de emoções que oscilam numa frequência arrítmica. Entre-um-tanto caem sobre a minha cabeça, pingos de agua ecoando “..nunca mais…nunca mais…nunca mais…nunca mais…nunca”.
Nunca mais um beijo, nunca mais um abraço, nunca mais uma conversa, nunca mais um sorriso, nunca mais uma gargalhada, nunca mais uma troca de olhares, nunca mais um revirar de olhos, nunca mais apareces à entrada da sala, nunca mais te vejo ao fundo do corredor, nunca mais me acordas com jeitinho, nunca mais o conforto da tua presença mesmo que no silêncio… e se tu gostavas de falar, falar, falar …e eu às vezes mais de silêncio, nunca mais saber que estás mesmo que eu não saiba onde, nunca mais um “tão boniiiiita” antes de eu sair de casa, nunca mais tás injojada ou airosinhanunca mais a-minha-mãe.


Incansável. Questionava-me e nunca te perguntei como conseguias ser todos os dias incansável comigo que já sou graúda,…agora fervilham perguntas das quais nunca mais posso escutar as tuas respostas. Acredito que no desenrolar da vida, se atenta, as venha a descobrir.

Sempre pronta para seguir comigo. “Eu ainda sou mais maluca do que tu…”,dizias-me… querias ver, querias ir… e eu cada vez queria mais levar-te… integrar-te nos meus dias, despertar-te para o tanto que ainda tinhas para experienciar e ver o brilho do olhar da minha bonequinha. O meu envelhecer alertava-me para a importância do rejuvenescimento do teu ser e do teu estar.

Agora vou sozinha na certeza de que quando chegar a casa também já não me vou sentar na cadeira da cozinha a roubar-te espaço e atenção às lides domésticas e dessa feita ser eu a falar, falar, falar… e “mãii estás a ouvir-me?”

Agora…fico calada a abafar a ansiedade mecanizada de tempos que passaram há pouco.

Já devias estar a dormitar (passa pouco da meia-noite) quando não resisti a acordar-te para te mostrar este desenho, quem sabe se dentro de ti não se daria o milagre que tanto esperei e pedi. Conforme observavas só dizias "hhhaaan, hhhaan", “Então não dizes nada?”… “Tá tão liiindo”. No dia seguinte voltei a mostrar-te e pedi (dentro de mim supliquei-te desesperadamente):
- “Não me deixes cair
- “Não me deixes cair tu” respondeste-me …

A 4 de Maio de 2011 ficou de mim uma espécie de ser rendilhado, da qual todos os dias se desprendem pedacitos e assim será até ao resto da minha vida. Percebo que é importante reinventar-me a cada dia, para não sucumbir ao desejo de voltar a ver-te. E é importante agradecer…a quem ajuda a colar outros pedacitos, retalhos novos aos quais também eu tenho de acostumar-me.

Como quem olha para o céu a tentar descobrir formas nas nuvens, assim ando eu dentro e fora da cratera a descobrir que me revelam os relevos que na minha vida deixaste.

Mãe-que-só-há-uma a minha saudade permanece

Incansável




como o teu Amor